Um jovem casal estava ouvindo rádio e se preparando para o Natal em 23 de dezembro de 1975, quando ouviu uma batida na porta. Quando Rob Parsons e sua esposa Diane resolveram atender o chamado, se depararam com um homem desconhecido os encarando do lado de fora da casa em Cardiff, País de Gales.
Na escada estava Ronnie Lockwood, um homem com barba por fazer, roupas sujas e amarrotadas e cabelos castanhos despenteados. No entanto, “Havia algo de incomum nele”, disse o advogado Rob, agora com 77 anos, ao portal de notícias Metro.
Ronnie, que estava com um saco de lixo preto abrigando todos os seus pertences e um frango congelado nas mãos, perguntou para Rob: “Você não sabe quem eu sou?”. Segundo o advogado, ele não reconheceu Ronnie de primeira, mas em um instante, lembranças antigas voltaram com força.
“Um dia, na Escola Dominical, na capelinha da esquina da minha rua, a professora, Srta. Williams, apresentou um menino novo, o Ronnie. Ela disse que ele tinha alguns problemas, e uma das primeiras coisas que ele fez foi dar uma gravata no meu amigo e esconder a bolsa da Srta. Williams”, lembrou Rob.
Ronnie teria desaparecido quando tinha oito ou nove anos. Mais tarde, descobriu-se que uma autoridade local o havia tirado da casa dos pais e o colocado em um lar, que foi descrito por Rob como uma escola para meninos com problemas de comportamento, a 320 quilômetros de distância de Cardiff .
Ao ser questionado sobre o frango, o homem contou que tinha ganhado o alimento de presente de Natal mas que não sabia cozinhar. Rob, então, o convidou para o jantar. Mas o que ele não imaginava era que depois dessa primeira refeição natalina, Ronnie participaria de outras 44.
O advogado preparou um café enquanto sua esposa cozinhava, e os três ficaram sentados à mesa da cozinha em quase total silêncio, interrompido apenas pelas perguntas do casal. Quando perguntaram a Ronnie onde ele estava dormindo, o homem respondeu com: “aqui e ali”.
“Ele era o homem mais gentil”
O casal decidiu deixá-lo ficar até depois do Boxing Day (26 de dezembro). Com a chegada e a passagem do Boxing Day, Rob e Diane perceberam que não podiam expulsar o homem e decidiram pedir conselhos às autoridades locais sobre o que fazer.
“Fui falar com o pessoal do centro para pessoas em situação de rua e eles disseram: ‘Bem, o problema é que, para conseguir um emprego, ele precisa de um endereço. Para conseguir um endereço, ele precisa de um emprego’. Esse é o dilema em que muitas dessas pessoas encontram”, disse Rob ao Metro .
O casal abrigou Ronnie no quarto de hóspede por alguns meses enquanto ele se estabelecia no seu emprego de lixeiro. No entanto, os filhos do casal começaram a nascer e Ronnie continuava lá. Eles, então, decidiram que era hora de pedir ao hóspede que encontrasse uma casa própria.
Rob conta que chegou a subir até o quarto de Ronnie, mas antes mesmo de falar algo, o inquilino perguntou: “Eu fiz alguma coisa errada?”. Neste momento, Diane invadiu o quarto, arrastou o esposo escada abaixo, caiu no choro e disse: “Não podemos fazer isso”.
O advogado conta que nem tudo foram flores e que houve momentos difíceis. Ronnie os acordava de madrugada fazendo barulho na cozinha, gastava seus ganhos em jogos de azar e que frequentemente precisava ser lembrado de realizar sua higiene pessoal.
“Quase até o dia de sua morte, ficávamos perguntando para ele: ‘Você já tomou banho? Já fez isso? Já fez aquilo?’ E, no entanto, ele era o homem mais gentil”, lembra Rob.
Apesar das dessas dificuldades, Ronnie ajudou a família em um momento difícil. “Depois do nascimento de Lloyd, Diane acordou um dia e me disse: ‘Não aguento mais’. Ela tinha acabado de fazer uma cirurgia na vesícula, sofrido um aborto espontâneo, dado à luz Lloyd, nos mudado e, por fim, ela foi diagnosticada com síndrome da fadiga crônica. Foi aí que o Ronnie se revelou e se prontificou a ajudar. Ele preparava a mamadeira para o bebê, sentava com a Katie enquanto eu levava o Lloyd para passear no quarteirão e fazia feijão com torradas. Quando ele se juntou a nós, era um inquilino, depois se tornou um amigo e, de repente, se transformou no irmão que eu nunca tive”, explicou Rob.
Em 2020, na pandemia, Ronnie caiu em seu quarto e ficou impossibilitado de se mover. Após ser internado, o homem sofreu dois AVCs e morreu aos 75 anos.
Após sua morte, um novo centro de bem-estar de £ 1,6 milhão ( R$11.192.064) , anexo à Igreja Glenwood em Cardiff, recebeu o nome em sua homenagem. O Centro Lockwood, financiado em parte com o espólio de Ronnie, foi inaugurado por Mark Drakeford, então primeiro-ministro do País de Gales .
Rob deixou seu escritório de advocacia e, junto com Dianne, fundou uma instituição de caridade que impacta a vida de milhões de pessoas. O advogado também escreveu um livro chamado “Uma batida na porta” onde conta toda a história de vida do seu grande amigo e irmão, Ronnie Lockwood.